Por Jonas Badermann de Lemos e Bianca Breyer Cardoso
Como será a infraestrutura física dos estabelecimentos de saúde em 2050? Quando nos perguntamos acerca do futuro, geralmente pensamos em filmes de ficção científica, equipamentos de altíssima tecnologia e robôs, muitos robôs. Pois bem, o futuro já começou em muitos destes edifícios ao redor do mundo, cujo cenário já se assemelha ao que desenhamos em nossas mentes. Telemedicina, Nanotecnologia, Big Data e Robôs, da cirurgia ao laboratório, da enfermagem à limpeza, em todas as tarefas passíveis de automatização.
O que de ainda mais novo pode surgir e de que forma nós e, mais especificamente, nossas instalações físicas, podemos nos preparar para acolher toda a transformação que virá?
Flexibilidade, resiliência e sustentabilidade são palavras chave para o futuro dos edifícios de saúde. Consciência e sensibilidade são ativos preciosos frente a esta infinidade de inovações que promovem uma transformação na forma de cuidar da saúde. Planejamento sustentável e consciente é a grande resposta para que nossos estabelecimentos estejam direcionados à mudança. O legado do planejamento é fruto do diálogo e da sensibilidade, e se configura como a melhor herança aos gestores do amanhã.
Sabemos que a dinâmica do edifício hospitalar é incessante, que um hospital sem obras está doente, mas de que forma podemos encaminhar este planejamento das instalações físicas como um processo contínuo, orientado ao futuro, sem perder de vista sua natureza sistêmica, em perfeita analogia ao corpo humano e ao olhar holístico que a medicina integrativa propõe ao paciente?
Antes de mais nada, é fundamental que cada gestor tenha em mente que o espaço físico interfere na qualidade dos processos assistenciais e pode afetar a experiência do paciente, a satisfação dos colaboradores e os resultados da organização. Arquitetura Salutogênica, Design Baseado em Evidências, Psicologia Ambiental e Neuroarquitetura são alguns dos conceitos que abordam o papel do espaço físico na promoção da saúde e do bem-estar. Em paralelo, há o rol dos parâmetros normativos do planejamento físico-funcional em saúde. Além destes, as tendências de mercado, os custos e a constante atualização tecnológica. Assim, a organização espacial destes edifícios pressupõe um preparo que extrapola a simples composição formal e programática e exige conhecimento específico e abrangente, impondo ao arquiteto papel central no suporte técnico aos gestores.
O Plano Diretor Físico-Funcional se constitui como principal ferramenta para o planejamento de um estabelecimento de saúde, ao propor sua macro organização no espaço e no tempo. Em seu desenvolvimento, envolve os setores administrativo, financeiro, operacional e assistencial, tendo o arquiteto como promotor da reflexão acerca do futuro da estrutura física.
Muitas são as abordagens possíveis na elaboração do Plano Diretor de um hospital existente, por exemplo. Em linhas gerais, todas envolvem uma fase de diagnóstico, que pode ser precedida da análise, e outra de prognóstico, que pode ser sucedida pela proposta final, conforme o panorama abaixo.
A primeira etapa de desenvolvimento do Plano Diretor consiste na análise geral da Instituição, para que se defina claramente sua razão de existir. Quem somos? A que nos dedicamos? Quem são nossos clientes? Como fazemos? Em que nos diferenciamos? Qual é nosso papel na rede assistencial? Para onde nos dirigimos no futuro? Essas indagações auxiliam a compreensão das finalidades institucionais e sugerem elementos para materializá-las na proposta final.
Esta etapa contempla também uma visão global e integrada de todos os elementos que incidem no funcionamento de um hospital e dos cenários político, legal, econômico, sociocultural e tecnológico, que influenciam sua gestão.
A análise minuciosa serve para guiar as discussões, decisões, necessidades programáticas, fases de implementação e futuras ampliações e reformas, consolidando o Plano Diretor como norteador do conjunto da gestão, através de um sistema de controle e de avaliação, que facilita sua própria reorientação e espelha a dinamicidade da própria instituição.
No caso de um estabelecimento existente, a segunda etapa objetiva a análise da estrutura física, que culmina no diagnóstico. Iniciando pela inserção urbana, considera aspectos de mobilidade e acesso, deslocamento dos usuários e natureza dos fluxos, a fim de prever adequada acessibilidade. Os condicionantes ambientais do entorno e a interface com vizinhos também são analisados, a fim de identificar visuais privilegiadas, condições de insolação e ventilação, presença de áreas verdes e centralidades pré-existentes. Por fim, observa a inserção na paisagem urbana e se a imagem é compatível com sua missão.
Do ponto de vista arquitetônico, o diagnóstico analisa: organização circulatória (acessos, controle e fluxos); abastecimento e distribuição; contiguidade entre as unidades e suas relações funcionais, aspectos de flexibilidade e obsolescência da edificação, e aspectos de humanização. Recomenda-se, também, analisar projetos em andamento e impactos de implementação. Por fim, é fundamental compreender como os processos praticados condicionam a planta arquitetônica e, em que medida, a reorganização espacial deve delinear novos processos, em consonância com as boas práticas e a proposta assistencial da instituição.
O diagnóstico da infraestrutura verifica o estado de conservação e obsolescência das instalações hidrossanitárias, elétricas, de lógica, de combate a incêndio, de climatização e exaustão, de gases medicinais, tratamento de efluentes e resíduos. Tal análise deve contemplar rotinas de manutenção e prevenção.
Finalmente, o diagnóstico deve comparar os requisitos normativos e a situação existente, apontando eventuais pontos de conflito. Neste aspecto, é fundamental considerar a capacidade instalada, que interfere na produção e, via de regra, é impactada pela regularização de áreas, fluxos e equipamentos.
A etapa de prognóstico delineia as estratégias para estruturação do Plano Diretor, elencando diretrizes conceituais, assistenciais, funcionais e tecnológicas. As Diretrizes Conceituais servem como fio condutor para os projetos das diferentes unidades, que são realizados em momentos distintos, mas devem estar alinhados aos preceitos institucionais. Aborda os princípios norteadores da concepção arquitetônica, sua dimensão estética, a ambiência desejada, os estímulos que se pretende promover através do espaço e as características para garantir legibilidade, segurança, acessibilidade e unidade, materializando a identidade e o caráter da marca.
Já as Diretrizes Assistenciais contemplam a política de cuidados e aspectos relativos à qualidade e eficácia dos processos e à segurança, conforto e bem-estar de pacientes e colaboradores. Aqui são listadas também as áreas de atuação em que se deseja atuar como referência e todas as certificações e acreditações desejadas.
As Diretrizes Funcionais definem o esquema circulatório, as linhas de expansão e áreas para ampliação, norteando futuras intervenções. Determinam os serviços que são necessários para o funcionamento do hospital e os que deverão ser incorporados, conforme o planejamento estratégico. Além disso, ao verificar o modelo de gestão, o número de colaboradores, as atribuições e a listagem das atividades, conforme a RDC nº 50, estabelecem o Programa de Necessidades.
Por fim, as Diretrizes Tecnológicas orientam a aquisição de novas tecnologias, pensadas do ponto de vista do espaço e da infraestrutura necessária, considerando os Equipamentos Biomédicos, suas características espaciais e de instalação. Aqui são contemplados os aspectos de eficiência energética e sustentabilidade econômica e ambiental, desde a instalação até a manutenção.
A última etapa apresenta o Plano Diretor como produto deste processo e resulta em modelo tridimensional; implantação com áreas de expansão; zoneamento em planta; e relatório síntese. É fundamental evidenciar a imagem do futuro, para indicar aonde se quer chegar e as etapas até o objetivo delineado.
Em linhas gerais, todo o processo é orientado pela perspectiva contemporânea do cenário de saúde, que ultrapassa as questões arquitetônicas e urbanísticas e abrange a abordagem da sociedade em relação ao conceito de saúde, passando por aspectos assistenciais, tecnológicos e administrativos que impactam na gestão e planejamento de um estabelecimento assistencial de saúde.
A transparência do processo, que culmina na visualização do Plano Diretor, serve também de estímulo e empolgação para os envolvidos com a missão institucional, pois permite vislumbrar o espírito da organização com a qual estão comprometidos, fazendo com que caminhem para um mesmo propósito, na busca pela concretização da imagem futura desejada. Ao longo do caminho, os rumos podem ser revistos assim como a rota é recalculada, mas definir o destino em que se deseja chegar é tarefa primeira nesta viagem chamada futuro.
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